Controle político do Conselho Consultivo da ANPD será assumido pelo Ministério da Justiça

A partir deste momento, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados não terá mais a prerrogativa de nomear os representantes das entidades que integrarão o Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade (CNPD). As organizações interessadas deverão encaminhar diretamente os candidatos ao Ministério da Justiça para avaliação.

A ANPD não terá participação alguma no processo, nem terá que formar lista tríplice. A decisão de aprovar os nomes propostos e encaminhá-la (a lista) ao presidente Lula para a nomeação caberá à equipe do ministro Flavio Dino.

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Essa alteração encontra-se disposta no Artigo 15, parágrafo 5º do recém-publicado Decreto Nº 11.758/2023, datado de 30/10/2023, o qual substituiu o anterior Decreto Nº 10.474/2020 que delineava a estrutura organizacional da ANPD. De acordo com o novo texto recentemente divulgado, as organizações da sociedade civil “poderão indicar, livremente, representantes ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, no prazo de trinta dias, contado da data de publicação do edital de convocação no Diário Oficial da União, com a indicação de um nome para a respectiva vaga“. 

A composição do CNPD foi modificada, resultando na saída de alguns ministérios na seção que diz respeito aos representantes do Poder Executivo. O Ministério da Justiça assumiu a presidência do conselho, uma função que anteriormente estava a cargo da Casa Civil da Presidência da República. A partir deste momento, a nova formação dos membros do Executivo no CNPD será a seguinte:

I – um do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que o presidirá;

II – um da Casa Civil da Presidência da República;

III – um do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos;

IV – um do Ministério da Saúde;

V – um da Secretaria de Comunicação Social;

Com a implementação desta nova composição, o CNPD sofreu alterações significativas. Deixaram de fazer parte do CNPD os Ministérios da Economia, que foi extinto; da Ciência, Tecnologia e Inovações; e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI). Os demais membros do CNPD que não são parte do governo mantiveram suas posições conforme a estrutura anterior.

Controle do Ministério da Justiça

Essas mudanças representam um revés considerável para a Autoridade Nacional de Proteção de Dados e validam os rumores que sugeriam que o Ministério da Justiça estava incomodado pela impossibilidade de influenciar a gestão do órgão, especialmente na nomeação de novos diretores, que possuem mandato.

Se o Ministério não pode exercer influência direta sobre a ANPD e, por consequência, sobre a orientação da regulamentação e aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), então parece estar buscando essa influência por meio do CNPD, como parte de sua estratégia.

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Além disso, com o controle que passará a ter na seleção dos membros do CNPD, o ministro Flavio Dino ganha a possibilidade de indicar sua atual Assessora Especial para Direitos Digitais no Ministério da Justiça, a Advogada Estela Aranha, para a coordenação do órgão. Há fortes rumores no mercado sobre a liderança de Estela no CNPD, e em breve teremos a confirmação ou negação dessas especulações.

Além disso, Estela Aranha assumiu recentemente uma posição de destaque no âmbito global, ao ser designada para fazer parte do High-Level Advisory Board on Artificial Intelligence, um órgão consultivo da ONU criado com o propósito de discutir a implementação de uma ‘governança global da Inteligência Artificial’.

Esse é mais um elemento que aponta para a influência de Estela no comando do CNPD, uma vez que, de forma indireta, sua atuação trará à tona a discussão sobre a regulamentação da Inteligência Artificial para o âmbito da gestão federal da proteção de dados. Essa dinâmica aumenta as perspectivas da ANPD prosseguir em sua iniciativa de se consolidar como o órgão regulador do setor, ao integrar de forma mais efetiva o debate sobre a IA e sua interseção com a proteção de dados.

No entanto, essa mudança não é vista com otimismo por todas as partes. Algumas fontes do setor demonstraram certa apreensão diante do aumento do poder do Ministério da Justiça sobre o CNPD. Eles argumentam que, quando a formação da lista tríplice dos membros do conselho consultivo era feita pela ANPD, a Autoridade, há chance de loteamento político e através dele tornar a ANPD numa espécie de órgão de controle, como o Tribunal de Contas da União, por exemplo.

Independentemente disso, a atuação do Ministério da Justiça parece benéfica em pelo menos um aspecto: ao diminuir o grau de influência da ANPD, também reduziu a presença de um lobby evidente por parte de empresas interessadas em ingressar no conselho. Houve casos em que a relação dos candidatos representantes de organizações sociais foi obscurecida, a fim de acomodar entidades claramente voltadas para interesses empresariais.

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